Carta aos Pais
Ex.mo Sr.
Encarregado de Educação:
Tendo em conta a
gravidade da situação do país e, muito em particular, da Escola Pública, dirigimo-nos, deste modo, aos Pais e Encarregados de Educação.
Como é sabido, o Governo tem vindo a encetar uma série sucessiva de
cortes nas funções do Estado e, em particular, na Escola Pública,
visando, ao que dizem, equilibrar as contas públicas e diminuir a dívida
do país.
No entanto, como também é público, não só
a dívida global do país tem aumentado como também o défice, pese embora o
crescente empobrecimento de funcionários públicos e pensionistas,
não dá sinais de estabilizar. Em grande parte, a subida da dívida e a
manutenção do défice nos valores atuais deve-se a que as
políticas de
austeridade têm conduzido a um brutal aumento do desemprego, e
consequentes encargos sociais, e à diminuição do consumo em geral,
fazendo diminuir, ao mesmo tempo, os resultados das coletas de impostos, em virtude da diminuição acentuada da atividade económica.
No entanto, o efeito destas políticas especificamente sobre a Escola
Pública é ainda mais terrível. Tendo como objetivo a sua
desestruturação, o Governo decidiu encetar na Educação uma série de
políticas, das quais destacamos:
- cortes nos apoios socioeconómicos às famílias (SASE, NEE, apoios escolares…);
- aumento do preço dos manuais escolares;
- aumento do custo dos passes de transportes escolares;
- aumento do número de alunos por turma, até ao máximo de trinta;
- aumento do horário de trabalho letivo dos professores, implicando a diminuição de aulas de apoio individualizado aos alunos;
- aumento de número de turmas e de alunos por professor, que pode, em alguns casos, chegar a mais de 250 ou mesmo 300 alunos por professor;
- diminuição do número de horas dos professores para receber as famílias dos alunos;
- quase eliminação de horas no horário de trabalho dos professores para o trabalho individualizado ou não disciplinar com os alunos;
- congelamento das carreiras e progressões profissionais dos professores, há pelo menos seis anos;
- redução acentuada dos salários;
- redução do número de funcionários auxiliares/administrativos.
Todas estas políticas, incluindo um novo e considerável
aumento do horário de trabalho dos professores,
nova redução de salarial, anunciado
aumento das propinas dos alunos (espécie de taxas moderadoras da educação), das refeições escolares/bar/reprografia têm
um único objetivo:
reduzir
o investimento na educação até um mínimo desprezível, permitindo o
despedimento do máximo de professores e outros funcionários das escolas,
abrindo espaço à privatização do ensino público e à sua transformação
num negócio, transformando a Escola Pública numa escola exclusiva para
pobres.
Claro que conhecemos uma certa argumentação segundo a qual o
despedimento de professores tem diretamente a ver com a redução do
número de alunos. Mas isso simplesmente não é verdade.
O número de
professores aposentados nos últimos anos tem sido verdadeiramente
esmagador, compensando a relativa diminuição do número de alunos, para
já não falar no enorme número de adultos e jovens adultos portugueses
com baixíssimas qualificações que procuram as escolas portuguesas mas a que estas, pelos cortes produzidos, não são capazes de responder.
A Escola Pública está no centro da Democracia portuguesa.
Ela
é o seu mais poderoso instrumento de ascensão, mobilidade e igualdade
social, tendo produzido as mais qualificadas gerações da história de
Portugal, permitindo que os jovens de todas as classes sociais e níveis
económicos pudessem aspirar a uma vida melhor. O que estas políticas
do Governo pretendem é, pelo contrário, diminuir a capacidade de ação
educacional e cívica da Escola Pública, entregando ao mercado e à
competição económica a tarefa de qualificar os portugueses. Todos
sabemos onde isso nos irá conduzir: à
criação de uma sociedade com dois níveis: um para ricos e outro para pobres, sem espaço para a justiça e a igualdade social. A curto prazo é a própria democracia portuguesa que está em causa.
Todas estas políticas afetarão imediatamente
as vidas de milhares de professores, muitos com dezenas de anos de serviço,
conduzindo-as à pobreza, mas, logo a seguir,
afetarão também profundamente todos os portugueses e a
capacidade da Escola Pública para
educar e formar as crianças e jovens, eliminando as suas perspetivas de um futuro com um mínimo de esperança e prosperidade.
Todas as posições que os professores venham a adotar visam defender a
Escola Pública. Neste sentido, vimos
apelar aos pais dos nossos alunos para que se ponham do nosso lado na defesa de uma educação de qualidade; sem
um número mínimo de professores e condições profissionais, o seu
trabalho será crescentemente difícil ou, até, uma triste
impossibilidade, cujo preço final não deixará de ser pago pelos alunos
das escolas portuguesas.
A defesa da Escola Pública e do trabalho, com qualidade, dos
professores, é, afinal, a defesa das crianças e jovens de Portugal
(vossos e nossos filhos), para os quais se exige a nossa mobilização e
ação conjuntas.
Contamos consigo.